Ao observar esta cena recordo outro episódio semelhante há cinco anos atrás. Restaurante de hotel de quatro estrelas. Uma família composta por pai, mãe e filha almoçam na esplanada. O pai come algo em frente ao computador. A mãe folheia uma revista de moda enquanto come uma salada. A filha, com os seus dez anos, come um hambúrguer e lê um livro de banda desenhada da Disney. Estão os três juntos cerca de uma hora sem dirigirem uma palavra uns aos outros.
Estes dois episódios fazem-me refletir no significado do casamento em pleno século XXI. O que leva alguém a casar e a constituir família e depois não a desfrutar?
Hoje já dificilmente alguém tem um “casamento arranjado” como os mais velhos relatam que casavam porque ela era boa moça ou ele vinha de boas famílias trabalhadoras. O Portugal em que hoje vivemos e em que as pessoas dizem ter liberdade de escolha e casam por amor é o mesmo Portugal que surge nas estatísticas de 1 divórcio em cada 2 casamentos, ou seja, temos uma taxa de divórcio de 50%, segundo um estudo sociológico de 2010.
É urgente refletir neste paradigma. O que pode levar alguém a casar-se para algum tempo depois se separar? Muitos dirão que é a “vida de hoje”, o “não haver tempo”, as exigências do mundo laboral, e outras tantas desculpas que não respondem à questão fundamental. Se abrirmos uma revista de economia aparecem homens de negócios dando entrevistas e a dizer que a família é o maior bem que possuem. No entanto, são estes mesmos homens os que comem ao lado de uma mulher ou família sem abrirem a boca nem se quer para perguntar se a comida está boa.
Chego à conclusão que nos dias que correm ter família é mais um fator psicológico de estabilidade do que o valor incutido há uns anos atrás, quando a família era o seio do nosso desenvolvimento pessoal e social. Hoje, as pessoas vivem tão alheadas de si mesmas que o casamento e a constituição de família é mais uma das muitas coisas que se têm que fazer enquanto cá andamos. Não há tempo para se refletir no propósito do casamento.
Anda meio mundo à procura de alguém com quem casar e ser feliz. Muito bem, estou de acordo. Mas arranjar alguém para partilhar esta aventura maravilhosa que é a vida não deveria ser um meio para se alcançar algo mais em vez de ser um fim em si mesmo? Quantos não são aqueles cujos único propósito na vida é encontrar o/a tal, casar, ter filhos e nada mais? O casamento é o maior reflexo do trabalho interior que temos de desenvolver. Espelhamos no outro aquilo que somos. E quando algo está mal, então, temos de nos virar para dentro e questionarmo-nos: o que é que se passa comigo? O que tenho de trabalhar? O que devo mudar? O objetivo é ter um casamento feliz e saudável em que ambas as partes crescem e se desenvolvem e alcançar a realização individual através de um trabalho conjunto. O que se observa é exatamente o contrário: as pessoas procuram alguém que as “possa aturar” e que “lhes dê aquilo que merecem”. Não será isto um amor egoísta? Ao ser egoísta não poderá ser amor. Então, o que será? Que relações cultivamos? Se somos livres porque temos relações infelizes? Casar? Para quê?
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